AMIES

Assessoria Jurídica emite Nota Técnica sobre assunto Intervalo de Recreio

A assessoria jurídica da Associação dos Mantenedores Independentes Educadores do Ensino Superior (AMIES) emitiu Nota Técnica a fim de prestar esclarecimentos sobre o precedente proferido pela 8ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), no que diz respeito à flexibilização permitida pela reforma trabalhista em relação ao tempo à disposição do empregador, passível de remuneração.

NOTA TÉCNICA

Assunto: “Intervalo de recreio” – Tempo a disposição do empregador – Processo nº TST-ARR-1255-46.2011.5.09.0029. Decisão proferida pela 8ª Turma GMMCP/ehs/rt.

  1. Trata-se de pedido de esclarecimento formulado pela Associação dos Mantenedores Independentes Educadores do Ensino Superior (AMIES) acerca do precedente proferido pela 8ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), no Recurso de Revista com Agravo nº TST-ARR-1255-46.2011.5.09.0029, em virtude da Lei nº 13.467/2017, que alterou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

  2. A questão também é de interesse de outras entidades, sindicados e estabelecimentos de ensino.

  3. Dessa forma, com a finalidade contribuir para a compreensão do entendimento firmado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) e dos possíveis reflexos jurídicos no âmbito das Instituições de Ensino Superior elaboramos presente Nota Técnica.

I – DA SÍNTESE DO ACÓRDÃO – Processo nº TST-ARR-1255-46.2011.5.09.0029

  1. Trata-se de processo judicial movido por professora em face de instituição de ensino com objetivo, dentre outros, de contabilizar o tempo de intervalo/recreio na jornada de trabalho e na remuneração devida.

  2. No referido Acórdão, a professora interpôs Agravo de Instrumento ao Despacho que negou seguimento ao Recurso de Revista contra o acórdão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT). O Relator conheceu do Agravo de Instrumento, satisfeitos os requisitos extrínsecos de admissibilidade e no mérito, no que diz respeito ao tema “intervalo – recreio – tempo à disposição”, deu provimento parcial ao Agravo para mandar processar o Recurso de Revista.

  3. O acórdão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) manteve a sentença com o entendimento de que os intervalos de recreio não constituem tempo à disposição do empregador, tendo como fundamentos: (i) a reclamada não exigia que a autora atendesse aos alunos durante o período de recreio, pois não havia uma determinação da ré nesse sentido; e (ii) a autora poderia se recusar a atendê-los durante os intervalos sem que isso implicasse em falta ou negligência de sua parte, instruindo-os a procurá-la em horários destinados a atividades extracurriculares.

  4. Além disso, a Corte Regional entendeu que a disposição contida nos instrumentos coletivos, em sua Cláusula 9ª, referia-se às atividades extracurriculares, que devem ser remuneradas quando realizadas, mas que não abordava o intervalo do recreio, em que os atendimentos aos alunos não são passíveis de serem enquadrados como atividades extracurriculares. Assim, concluiu que os intervalos de recreio não devem ser computados na jornada de trabalho da professora, pois não representam tempo à disposição do empregador, não havendo ofensa ao artigo 4º da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho – Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, alterado pela Lei nº 13.467/2017.

  5. Em sede de Recurso de Revista, a professora Recorrente aduziu que os exíguos intervalos de recreio deveriam ser considerados como tempo à disposição do empregador, mesmo que não fossem obrigatórios e, portanto, deveriam integrar a jornada de trabalho e serem computadas as horas extras devidas, respaldada por sólida corrente jurisprudencial1, que determina que esses períodos devem ser considerados como tempo efetivo de serviço. Invocou o artigo 4º da CLT, que estabelece que o tempo à disposição do empregador é considerado como serviço efetivo, e o artigo 7º, XVI, da Constituição da República, que prevê a proteção do trabalhador quanto à duração do trabalho. Além disso, a Reclamante trouxe à baila a Súmula2 nº 118 do TST, que reconhece que os minutos residuais devem ser computados na jornada de trabalho.

  6. Diante dos fundamentos expostos e da jurisprudência, o TST conheceu do Recurso de Revista por violação a dispositivo de lei federal e lhe deu provimento parcial para determinar, no que tange ao tema em epígrafe, o pagamento das horas extras correspondentes ao período de recreio, considerando-o como tempo efetivo de serviço e reconhecendo que o intervalo de poucos minutos entre aulas configura tempo à disposição do empregador, garantindo ao professor o direito à remuneração, uma vez que a exiguidade do tempo entre as aulas intercaladas impossibilita o exercício de outra atividade no período e com isso o direito ao pagamento das horas extras correspondentes ao referido tempo de recreio, com os reflexos devidos.

II – DO “INTERVALO DE RECREIO” – TEMPO A DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR

  1. A “Reforma” trabalhista, promovida pela Lei nº 13.467/2017, foi responsável por diversas mudanças no âmbito da Consolidação das Leis do Trabalho3, dentre elas destaca-se o tempo à disposição do empregador, com alteração na redação do artigo 4º da CLT. Entretanto, trouxe exceções ao que antes era configurado pela jurisprudência do TST como “tempo à disposição”, indicando momentos em que o empregado permanece nas dependências da empresa, mas não está à disposição do empregador (práticas religiosas, descanso, lazer, estudo, alimentação, atividades de relacionamento social, higiene pessoal, e troca de roupa ou uniforme, quando não houver obrigatoriedade de realizar a troca na empresa).

  2. Ademais, conforme o parágrafo 2º do art. 4º da CLT, não será considerado tempo à disposição do empregador, ou seja, não será remunerado, o período em que o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas.

  3. No contexto da jornada de trabalho, o legislador de 1943 estabeleceu o conceito de “tempo à disposição do empregador” como responsável por fixar a duração da jornada de trabalho.

  4. De acordo com o artigo 4º caput da CLT, a menos que haja uma disposição especial expressamente estabelecida, considera-se como serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens.

  5. Importante destacar que, no caso dos autos, trata-se de discussão acerca do curto intervalo que divide duas aulas sequenciais e não se confunde com o intervalo que separa dois turnos distintos de trabalho, como matutino e vespertino, por exemplo.

III – CONCLUSÃO

  1. Numa breve síntese, verifica-se, no que tange ao tema “Intervalo de Recreio”, que a reforma trabalhista confere ares mais flexíveis à CLT, especialmente em relação à duração do trabalho, um elemento crucial nas relações entre empregados e empregadores.

  2. Anteriormente, a jornada de trabalho era determinada pelo tempo em que o empregado permanecia à disposição do empregador. No entanto, considerando a natureza dinâmica das relações trabalhistas contemporâneas, a CLT passou a flexibilizar essa ideia de disponibilidade, introduzindo expressamente uma série de exceções em relação aos períodos em que o empregado pode estar no trabalho sem necessariamente estar cumprindo sua jornada, conforme previsto nos incisos do § 2º do artigo 4º da CLT.

  3. Assim, embora o entendimento do TST tenha se consolidado no sentido de considerar o intervalo de recreio como tempo à disposição do empregador e passível de remuneração, sem prejuízo de eventuais recursos perante aquele Tribunal pelas partes legitimadas, a questão pode ser pacificada mediante alteração legislativa que inclua o “Intervalo de Recreio” no rol previsto no § 2º do art. 4º da CLT.

Brasília/DF, 27 de julho de 2023.

Esmeraldo Malheiros
Consultor Jurídico da AMIES
OAB/DF nº 9.494

1 (RR-195-78.2012.5.09.0651, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, 7ª Turma, DEJT 29/5/2015), (E-ED-RR-49900-47.2006.5.09.0007, Relator Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, SBDI-1, DEJT 12/9/2014), (RR-10916-09.2015.5.18.0013, Relatora Ministra Delaíde Miranda Arantes, 2ª Turma, DEJT 12/8/2016), (RR-280-61.2012.5.09.0652, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, 3ª Turma, DEJT 1º/7/2016).

2 Súmula 118/TST – 19/03/1981 – Jornada de trabalho. Horas extras. Intervalo intrajornada não previsto em lei. CLT, art. 59. “Os intervalos concedidos pelo empregador, na jornada de trabalho, não previstos em lei, representam tempo à disposição da empresa, remunerados como serviço extraordinário, se acrescidos ao final da jornada.”

3 Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.

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